Artigo da Senior Partner da VSM, Dra. Isabel Meirelles, na revista Frontline sobre a crítica do Presidente da Comissão Europeia à ausência dos deputados do Parlamento Europeu nas sessões plenárias

QUEM GUARDA OS GUARDAS?

Recentemente, o Parlamento Europeu e o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, foram alvo de notícia, por razões menos nobres. O facto de apenas estarem na sessão plenária, aquando do debate que avaliava o resultado de seis meses da presidência maltesa do Conselho, cerca de 30 deputados dos 751 que compõem o hemiciclo, mas com o registo na folha de presenças de 703 assinaturas, levou Juncker a apelidar o Parlamento Europeu de ridículo. A magna questão é saber o que andou e está mal, sobretudo depois do coro de protestos, designadamente do presidente do Parlamento Europeu, Antonio Tajani.

Perante esta situação, Juncker ainda mais indignado estava, porque se tratava de Malta, o mais pequeno país da União Europeia, que contava com a presença do seu primeiro-ministro Joseph Muscat, sabendo nós que o presidente da Comissão também foi cerca de 18 anos chefe de Governo do Luxemburgo, outro pequeno Estado, com o sentimento de que se se tratasse da presença de Merkel ou Macron, o vazio não se teria feito sentir de forma tão ultrajante. Contudo, o facto de os adjetivos que Juncker utilizou não serem os mais adequados não lhe retira a razão de fundo. Recorde-se que o Parlamento Europeu é a instituição mais democrática, pois é a única que é eleita por sufrágio universal, direto e secreto de todos os povos da Europa, nas únicas eleições internacionais conhecidas. Tem, assim, uma legitimidade que mais nenhuma outra instituição ou órgão da União Europeia detém, bem como poderes muito alargados em vários domínios, designadamente de natureza legislativa que partilha com o Conselho de Ministros. Controla, acrescidamente, a Comissão Europeia ao nível político desde a sua indigitação, nomeadamente através do debate de investidura e da votação em plenário da sua constituição, que se não for maioritária tem de ser recomposta. Ou seja, o presidente da Comissão e cada comissário é escrutinado, quer em termos de competência para as funções que se propõe exercer, quer muito particularmente em termos de idoneidade onde toda a sua vida, mesmo a mais privada, pode ser questionada.

Procedimentos a seguir

Ao longo do mandato, a Comissão deve apresentar o seu plano de atividades e o consequente relatório de atividades perante o Parlamento, bem como recebe quitação deste pela boa execução do orçamento da União, para além das centenas de perguntas orais e escritas que lhe são colocadas, regularmente, pelos deputados europeus. Para finalizar, o Parlamento Europeu tem nas suas mãos a denominada bomba atómica, em linguagem corrente, competência que consiste em poder apresentar uma moção de censura contra a Comissão, a qual, se for aprovada, terá como consequência a sua queda e obrigará à sua demissão em bloco. Ora, a tamanhas atribuições e competências desta instituição tão democrática, como é o Parlamento Europeu, deviam acrescer iguais responsabilidades no comportamento dos seus membros, designadamente a nível ético de comparência nos trabalhos do hemiciclo. Já sem mencionar os salários elevados, tema recorrente, os quais deviam garantir um menor nível de absentismo dos seus membros, embora haja justificações para todos os gostos, designadamente que durante o plenário decorrem outras reuniões que se lhe sobrepõem, designadamente as de comissões parlamentares. Estas são razões que devem bastar para reorganizar os trabalhos do Parlamento e não deixar que as sessões plenárias fiquem desertificadas, permitindo que os deputados exerçam as suas funções efetivas, que são as de questionar e exercer o seu controlo político sobre as outras instituições. Caso contrário, é caso para perguntar quem guarda os guardas!

Mais informação em http://www.revistafrontline.com/em-foco/isabel-meirelles-43/